Ronaldo.

Certa ou errada, não sei. Foi uma decisão. E decisão é coisa pessoal. Melhor, deveria ser. Quem sabe se os estudiosos que elaboram os dicionários incluírem esse detalhezinho na definição da palavra, a gente não começa a respeitá-lo.

Mas vamos lá, a semântica fica para depois. O fato é que Ronaldo decidiu parar, vítima dos anos de maus-tratos sofridos pelo corpo. Anos esses que poderiam ser mais longos, não fossem as contusões e também o desleixo com que cuidou de sua "máquina" em algumas ocasiões.

Sim, porque Ronaldo não foi um santo, nem mesmo um fenômeno. Apenas um humano como todos nós. Cometeu seus pecados, fez suas besteiras, deslizou, engordou, bebeu, fumou. Enfim, tal qual mero mortal, errou. Erros que, penso, não podem apagar o brilho de uma carreira brilhante, sob a tolice de que a "última impressão é a que ficará".
Mentira. Eu, por exemplo, lembrarei do final de carreira, para os profeneutas da objetividade, melancólico, da cria do São Cristóvão como mero equívoco. Medo de dar a adeus a um mundo onde viveu como rei, de ficar longe dos flashes, de, tal qual temia Zico, não ser reconhecido nas esquinas de Copacabana. Se profissionais que exercem profissões sem o glamour do universo da bola costumam sentir o impacto da aposentadoria, dimensionem o baque da perda da bajulação, das mulheres bonitas, das entrevistas e dos amigos de ocasião.

Do ponto-de-vista puramente técnico, Ronaldo foi o primeiro jogador com grife de "melhor do mundo" que acompanhei durante toda a carreira. Sim, tudo bem, vi Maradona e Ronaldo. Mas eles não contam, não cresceram comigo. Porque ambos éramos guris quando o dentuço começou a arrebentar no Cruzeiro.  Da Copa de 94, lembro que torcia para que o rapaz entrasse em campo um pouquinho que fosse, maravilhado com suas travessuras na Raposa das Alterosas. E o tempo, claro, passou. Eu me tornei um homem feito, o outro menino um ídolo. 

E ídolo de todas as torcidas. Pois se clubes de futebol são nações, Ronaldo é um cidadão sem pátria. Ah, sim, os corinthianos reclamarão, alegarão serem os legítimos donos do coração fenonemal. Talvez, os cruzeirenses reivindicarão a paternidade. Enquanto os flamenguistas, alguns, ainda machucados com a "traição" , rogarão mil maldições ao "gordo" ingrato. Pura balela. Quem para hoje não é um qualquer, mas um cara que conseguiu fazer um tricolor fanático aplaudí-lo ao massacrar, em 2009, seu, à época combalido, time.

Mas não há como encerrar esse texto sem decantar mais e mais o poder de superação de Ronaldo. Até porque, foi justo isso que faltou ao escriba em certas ocasiões. Poder de superação para enfrentar adversidades e não desperdiçar oportunidades. Confesso, em lances dessa vida faltou-me ser um pouco Ronaldo.

Por fim, resta desejar ao maior artilheiro das Copas paz, saúde e felicidade. Que ele,agora cuide dos filhos, desfrute da companhia da família, curta sua mortalidade. Mas que volte. Não como jogador. E, sim, como o dirigente atuante que insinua poder se tornar. Articulado, fera no marketing, querido nos bastidores, preocupado com as condições de sua classe. Mas, quer saber, se não for de sua vontade, não importa. Porque, como muito bem escreveu Décio Lopes, a crise gerada pelo Tolima vai passar, o mito Ronaldo para sempre existirá.