O América das minhas figurinhas.

figurinhas

Lembro perfeitamente. A caixa listrada, dentro as figurinhas. E sei lá se eram figurinhas mesmo. Acho que fosse hoje, o nome mais apropriado seria "cards". Uma figurinha em papel bonito, tá de bom tamanho.

Isso era lá por volta de 1991, 92. Eu morava com minha avó. Passei um tempo com a coroa pra poder estudar. É, não tem jeito, eu fui, como a gente diz quando vai sacanear alguém, "criado por vó". Vai, eu não pareço ter sido criado por vó, pareço?

E na época meu tio caçula, Márcio, ainda não havia casado. Então, pra fechar, a casa era Dona Nilza, meu tio e eu. Ponto. E era bacana. Ele, ás vezes, me perturbava, colocava uns apelidos, coisa de jovem. Mas, dava uns conselhos legais e também gostava de futebol. Aliás, outro tricolor fanático. E foi aí que surgiram as figurinhas. Ok, ok, os "cards". Não custa tentar atingir o público mais novo também.

Sem brincadeira, devia ter uma centena. Eram grandes, do tamanho de um desses celulares modernos. A definição das fotos, ótima. Tudo bem, seu exigente, a resolução era ótima para a época, conserto. O verso era show de bola também. Informações completas sobre os jogadores. Títulos conquistados, times pelos quais passaram, convocações para a Seleção Brasileira. Resumindo, um site de esportes, acessível pra todo mundo, mesmo para quem custou a ter a primeira TV, como foi o caso do Márcio.

E ele, depois eu, conhecíamos um monte de atletas e clubes. Eu gostava do Yura, do Grêmio. Do Polozzi, que tinha duas figurinhas, uma na Ponte Preta e outra no Palmeiras. Do Enéas, da Lusa. E, por causa da camisa, do Colorado. E me responda, você, caro leitor, que tem por volta de 15, 16 anos: sabia que um dia existiu um time no Brasil de nome Colorado?

Mas, antes de prosseguir, talvez seja conveniente explicar o porquê dessa tarde saudosista. E não se assustem. Na medida do possível, está tudo bem. Dona Nilza, esses tempos, sofreu uma pequena isquemia. Tá lúcida e tudo o mais. Mas, enfim, creio que já aconteceu com vocês alguma vez. Quando eu era o guri das figurinhas lá de trás, confesso ter alimentado a sensação de que a robusta senhora que me recebia na volta da escola todo dia com um sorriso e um pedação de pão doce com manteiga nunca enfrentaria os rigores da idade. Acho que é errado, eu deveria encarar as óbices da vida com naturalidade e maturidade. Mas, perdoem, pra mim é difícil assistir, impotente, ao tempo se esvair.

E, voltando ao futebol, tais sentimentos, saudosismo e subserviência aos caprichos do destino, com certeza, invadiram os corações de quem torce para o América-RJ, no último sábado. Ou será que o senhor que pegou três ou quatro conduções, falhou a memória, para apoiar o seu "Sangue" em Macaé, pensou, lá em setenta e poucos, quando minhas figurinhas surgiram, vê-lo duas vezes rebaixado?

Aliás, onde estão minhas figurinhas? Porque se não sabemos que existiu o Colorado ou que a Ponte Preta já montou grandes times, conhecemos, de cabo a rabo, a escalação do Manchester United ou, mesmo, o nome de Jarvis, melhor jogador do Wolverhampton.

Não, não é hipocrisia. Eu sempre gostei de futebol internacional, não nego. Mas, o que estamos fazendo? Até quando, em troca de interesses comerciais, destruíremos nosso melhor produto. Porque se agora foi o América, cara, porque não achar que amanhã será o Fluminense?

A vida tem me mostrado que nada dura pra sempre...

Boa semana e um abraço!